A
história do Portugal contemporâneo (VER AQUI)
Quando um dia for escrita a história do Portugal
contemporâneo, se é que alguém a conseguirá contar bem face à torpe realidade
dos factos sórdidos por ora vistos e vividos, por certo julgará o futuro leitor
estar em presença de conto de espantalhos ou de
fábula de sátiros viciosos. Certamente não vou poder lê-la, desde logo
porque já por cá não andarei mas, mesmo confiando em boa
interpretação de mui avisado historiador que por aí apareça, e na mais que improvável
perenidade do meu eu para o ler, dificilmente será narração histórica para nobilitar
os vindouros e o país enquanto, como devia ser, Estado com sentido. Procuro,
procuro e não acho siso em quase nada do que vai acontecendo nesta terra. Subtrai-se
continuadamente a sua realidade, a sua veracidade o seu valor. Surgem os
construtores do destino dos nossos
descendentes e como que parecem querer erigir os templos onde repousarão para
todo o sempre as obras que ufanam o nosso ser português. Depois, vêm os outros,
os que também parecem estar preparados para as alturas, e chegam para demonstrarem
que a adoração dos valores dos primeiros não é coisa que se deva fazer com fé
em impulso veloz. Cuidado, dizem estes, a
apreensão básica, simples, da demonstração dos que analisam causas e estruturam
templos, não garante a prosperidade, não é o sublime direito ao futuro. Acrescentam,
é mais estratagema ardil com que se oculta o verdadeiro plano, resultado de um
conjunto de ideias, de combinações que, graças a longa experiência de já tão longa
peregrinação no reino do suspeito, têm infelizmente vingado no seio dos atrevidamente
embusteiros. De facto, toda a realização, todo o passo em frente, deve ser
objecto de atinada reflexão por banda de quem, mais tarde ou mais cedo, o vai
pagar. Ora, como os Paços de certos edificadores ainda não estão concluídos mas
eu já os estou a pagar, e pelos vistos assim continuarei sabe-se lá até quando,
rogo a quem me lê que me atenda neste sussurro
do aprender a examinar as causas e os efeitos de tanta obra. Não é por refutar ideais que assim falo, só eu sei como luto por
eles, é apenas porque me ensinou a vida das auto-estradas, das rotundas, das
ciclovias, dos gimno-qualquer-coisa, dos estádios da matéria, dos centros de
congressos, das imponentes fachadas, que devo calçar luvas diante de tão “essencial”
construção que forrou o bolso de outros tantos, quase todos eles prenhes de genuínos
critérios de (a)moralidade.
Mário Rui