E se
me pedissem para definir o fictício de toda esta medíocre gente e de baixa
condição política, para não lhe chamar outro nome feio, eu diria, sem floreios:
esta é a nervura essencial de um País que não existe. Lamentavelmente! De facto, é impossível antever o que vai acontecer amanhã. Esse é
que é o grande barranco que se opõe ao desenvolvimento desta terra, sítio onde
já não há nivelamento, nem objectivo quer interior quer exterior, realidade
também é coisa que já partiu e por agora resta aquilo que a suposição de cada
um de nós quiser partejar. Mesmo a ficção fugiu a sete pés pois que percebendo
estar paredes-meias com gente de simulacros, optou, e bem, pelo abandono de
milhões de configurações eventuais trazidas à luz do dia através das brumas
contínuas de quem tem feito de Portugal um esboço de meras lacunas. O BES já
foi região que rondou a morte, o Novo Banco parece ser algo que se vai extinguindo
com o pensamento e em que a promessa de melhor saúde retrocede indefinidamente,
mas ninguém explica ao ‘portuguesito’ esta religião informe. O pretenso,
pretendido, ou suposto novo político, lá vai expelindo a marca da sua pequena
importância e depois de ter andado anos
a fio a criticar os políticos e de se ter candidatado ao PE, 18.000
euros/mês, porque tem de criar uma filha, decidiu entrar na vida
político-partidária e até apetece dizer que, deste modo, tenho de amealhar
ainda mais calma. Outro diz que as elites,
os notáveis, são responsáveis pelo estado a que o país chegou. Há muita gente
fora da tal Lisboa, a dos salões de alcatifa vermelha, de uma enorme qualidade,
acrescenta. É o apagamento do autor, espécie de epopeia destinada talvez a perpetuar
a (i)mortalidade do herói, porque o que diz já foi afinal esforço de todas as
noites de milhões de portugueses que nunca tendo pisado tapetes dessa cor, já
deles se tinham sentido presas na armadilha de tantos bacocos fundadores da
discursividade. Depois surge outro, anafado, pois que nunca teve fome mas antes
apetite a mais, a dizer que o Governo está num sarilho e que quando o “Dono
Disto Tudo” falar as coisas vão ser diferentes. Muito significativo é que esta
leitura seja feita a partir da música reflectida pela sua própria “obra” em
prol do país. Um dos herdeiros mais rigorosos e mais criativos da escola do moderno
regime à portuguesa. Música, pintura, arquitectura, filosofia, linguística, mitologia,
sol, praia, sinecurismo e o mais que convenha, é só ver os últimos quarenta anos
bem passados e de ângulo que me é familiar. Cito só mais dois. O primeiro, o
que dizia “vou andar por aí”, canta agora loas à ciência e à tecnologia trazidas
pelas emergentes e profundas raízes do antigo rival que depois estudou fora a
maneira de continuar dentro. Parece querer mensurá-lo como potência de
transformação, destacando-o como força de inovação e lugar de pensamento. Francamente,
como é possível tanta mentira? Para acabar, vamos então ao segundo: neste caso
apetece dizer que as mutações da relação entre o visível e o dizível já não são
como eram e portanto se o Presidente não soube tudo do BES foi porque não
perguntou, diz o Primeiro. Mas atenção, se a tradição se quebrou, não foi
certamente porque a arqueologia deixou de ser disciplina uníssona. Não,
quebrou-se apenas porque o meio está tão desregulamentado, resultado do colapso
progressivo a que assistimos, que já nem os casamentos políticos são tidos como
um romance. Passaram a ser simples compilação de contos mal contados. E assim
vai Portugal, a maior parte do tempo em busca da sociedade elusiva.
Mário Rui
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