Ao
cair da tarde também se pensa porque há luzes que só podem nascer de uma grande
soma de factos.
Há
só um mar no meu país. E esse, não importa de que lado se veja, oferece-me
sempre um surto de poesia, panoramas íntimos do coração, até onde se perdem os
olhares da minha ânsia de querer ver. Tudo lhe é passado, actualidade, futuro,
tudo presença. Sentimento, muito, por aquilo que me deixa cogitar quando lá
longe também perscruto a areia branca da praia. A maior de quantas distâncias
logre a minha memória recriar, assim fico no ontem até onde se somem todos os
‘hojes’ que me possam dizer que, afinal, não há abismos entre épocas. E assim,
do sítio onde estou até aquele onde outrora estive, já se estabeleceu a
corrente. Rápido como a luz corre o pensamento das coisas de antanho, das
amizades que comigo pisaram o areal, das mútuas atracções, dos apertos em que
se confundiram as mãos que se procuravam, ou tão-só dos abraços conseguidos
entre simpatias recíprocas. E quão curtos se faziam os dias. Mas, reconhecendo
a escassez das minhas faculdades para acomodar o ambiente de então às minhas
ideias de reconciliação presente, só posso estar grato a este mar, a este
vento, a esta praia. Abrem-me os olhos à realidade evidente da minha
incapacidade de mudar o tempo mas sem que abismos me separem de épocas. Por
ora, recolho a vela, navegante desenganado, antes que onda ciumenta me arranque
da alma a recordação sagrada.
Mário
Rui
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