Asas
brancas enfunadas de vento que muitos querem cortar ou a história de um sonho
por realizar
Sou
dos que não gostam de ver a tradição de boa índole dissolvida ainda que para o
efeito uns tantos me acenem com os impressionantes ventos do novo pensamento.
Sou ainda dos que acreditam que o legado deixado por essa mesma tradição pode
servir tanto para a perpetuar, como para a derrubar. Como para mim tal tradição
e história é algo feito para prover às diferentes necessidades de uma região ou
de uma comunidade, então opto pela perpetuação, respeito e amor às origens e
progressos de uma arte ou ciência antiga, única e amiga, na esperança de que o
futuro não seja puro capricho mas antes modo de estar comunitário. Tirem-lhe as
velas, o mastro, a simbologia do que foi e prometam-lhe então um futuro que é
aliado de coisa nenhuma e depois tirem-lhe também o pouco que lhe resta de
dignidade passada. Tudo o que por ora lhe fazem, ao camarada moliceiro, é
heresia dita moderna que consiste em alterar-lhe a alma para tolamente o
adaptar a esta situação de modernidade sem valores, em vez de alterarem a
situação para a adaptar à verdadeira alma do barco moliceiro. Se qualquer
mudança é efectivamente inconsistente com a essência de um passado que não
devia desaparecer da consciência colectiva de uma região, então anule-se a
mudança – mas não a essência de uma região. É uma pena que alguns tenham sido
informados de que podem usar os símbolos que lhes apetecer, desde que estes não
tenham significado algum para eles e, pior ainda, nos façam pensar que todas as
partes do que fomos e somos começam a ficar separadas umas das outras
tornando-se gélidas. Por este andar, depressa virá o tempo em que ouviremos
falar de especialistas que dividem o pessêgo do caroço, argumentando que se
estragam um ao outro. Pobres novos tempos. Razão, mas muita razão, tinha o
professor Jaime Vilar!
«O
barco moliceiro tem os seus dias contados. Vai a caminho do Museu se não se
perder ingloriamente entre tantos destroços de outros muitos naufrágios a que o
tempo tirano imola tudo o que é temporal. Ficará a sua memória, para a qual
quero deixar não um epitáfio de uma ruína nem uma crónica que ninguém pode
escrever, mas uma ode em tom elegíaco ao barco moliceiro, ex-libris de uma
região única no mundo, símbolo admirável e brasão de armas de um povo que
definiu a sua actividade pela geografia especial que a determina. Motiva-se a
juventude escolar para tantas tarefas de descoberta do mundo em que vivemos.
Porque não voltam as nossas escolas ribeirinhas os seus olhos interessados para
este tema deslumbrante? Hoje, já. Amanhã será tarde!»
Mário
Rui
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