Para
a doença em que se morre duas vezes, e a primeira é em vida – coisa estranha
mas real - parece não haver ainda poente que a sossegue em definitivo. Doença
degenerativa que leva a um galopante ‘ser’ em ‘não ser’, a par de outras, e que
não mais significa do que baixar a ponte levadiça da vida, perder as sentinelas
e começar a redigir o terrível manifesto da despedida. É, é assim e mais nada
do que este assim. A fala faz-se tardia, a ideia enferruja-se e lá vem o
tenebroso estado sem viveza mental, incapaz de exprimir emoções por conta
própria. E por conta alheia, dolorosa igualmente, ainda que tentada a
esperança, resfria toda e qualquer ideia de efusão de sucesso. Mesmo ao mais
simples aceno de batuta, a orquestra que ouvíamos afinada, já só dá respostas
destoadas. E a vida, que raio de vida, num acabar destes nunca dá qualquer
penduricalho de mercê por bons serviços. É um deplorável episódio de fim de
viagem. Não sou médico, de cientista seguramente também não faria reputação,
tentei então a ciência no amparo ao drama. Não esqueci a sorte, acalentando a
ideia de que para a cativar era preciso insistir. Palavra, acho indecente, o
resultado não foi o esperado. É por isso que quero continuar a acreditar que
essa ciência, os homens que a interpretam, não vão deixar cair os braços na
luta contra a doença, contra as doenças. Que vão conseguir enxugar a neblina
que cerra a descoberta das curas de modo a que, tanto quanto possível, se
erradiquem os coleccionadores de dramas íntimos. Força ciência, porque em cada
cura há gente que quer tornar a viver!
Mário
Rui
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