Quanta melancolia baixava à praia com
o cair da tarde! E do mata-ratos tirava-se uma fumaça, mais por distração do
que por necessidade. Na cabeça, com a mesma imperturbável serenidade,
protegia-se a torreira dos excessos do sol. Enquanto isso, a cada remendo findo
acrescentava-se mais uma valiosa esperança no primeiro lanço do dia seguinte.
Cosendo à surda na rede, unificava-se a centelha da vida difícil das artes da
pesca. Chegada nova manhã, quando os clarões da aurora acordavam as ondas,
recomeçava ele a faina, como na véspera, como sempre. Vinda a velhice, as
pernas e os braços cansados e entorpecidos, os olhos já enevoados como qualquer
bruma praia adentro, era então tempo de ir andando de pouso em pouso remendando
outra vida com os camaradas e com uns poucos de decilitros. Sempre se evitava
que a solidão alargasse os seus limites e se tornasse acabrunhadora. Era pois
tempo de rememorar as vagas que havia navegado, as que havia vencido para
chegar ao fim da viagem. Ainda assim, às vezes, só uma voz íntima, em surdina,
um rumorejar consigo, porque a peitos outrora robustos é-lhes sempre
indiferente o urro alheio.
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