segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Os homens e os outros


Vezes sem conta tenho ouvido falar da incompetência, e eu concordo com o qualificativo, da classe política que nos tem (des)governado ao longo de tantos anos. Um dia destes, já se conta quase meio século desde a altura em que, fazendo jus à sublime arte de enganar o próximo, uma catrefada de homens ditos públicos, o que será lá isso, se decidiu por arrasar o que de menos mau o País tinha. Arrasaram ancestrais modos de vida, é certo que nem sempre agradáveis para quem os vivenciou, sobretudo porque atrasados no tempo e no modo, mas ainda assim ávidos de melhores dias, porque sedentos de inovação. Mas não! Decidiram os tais ilustres estrategas do meu pobre País que, definitivamente, a modernidade era tão só uma ideia nova. Nada mais que isso e, vai daí, a reboque de outras tantas mentes brilhantes do velho continente, entenda-se gente que pensa e portanto sabe, estudaram no Parlamento Europeu, destrua-se o que parece improdutivo, o que se lhes afigura menos digno de uma terra moderna e aí vem um Mundo novo. De facto, se ao tempo Vasco da Gama assim tivesse pensado, certamente teria encostado o barco às Berlengas e não mais avançaria. Mas felizmente não o fez, isso era gente de outra tempêra. Livre-nos o Deus maior de qualquer comparação.
Bom, mas vem tudo isto a propósito da estocada final que há uns anos foi dada às pescas e à agricultura portuguesas. Gerações de lobos do mar foram votados ao desprezo, ao abandono, à fome e, com eles, inevitavelmente, também os barcos se afundaram. Triste sina dum povo marinheiro que outrora, na matéria, deu cartas ao Mundo e que graças a essa épica epopeia guindou este rectângulo, ou será já quadrado?, aos mais altos ditâmes de civilização que se preze. Quanto à lavoura, porque atrasada como já se disse, nem vale a pena apostar. De que vale falar em inovação se nos pagam para fechar a loja? O celeiro antes prenhe de diamantes da terra arável, é hoje um esqueleto do qual já nem memória resta. Os agricultores, essa raça que incomodava a Europa rica, era chão que já tinha dado uva. Abatam-nos pois, a uns e outros, porque a miséria do meu País é ainda mais visível à luz de cada um destes pequenos horrores. Assim devem ter pensado ministros, depois parlamentares, depois Presidentes, depois a casta arregimentada que serve de lastro a esses pobres príncipes reinantes. Por quanto mais tempo?
Ah, mas eis que novos tempos correm e novos pensadores vão agora tentar a eloquência mais convincente! Não têm os meus caros leitores dado conta do frenético clamor que por aí vai quanto ao ressurgimento destas nobres actividades? São absolutamente decisivas para o nosso futuro. Dizem eles. Os mesmos que feriram de morte este nobre povo, do mar ou da terra ou de qualquer outro lugar, reclamam hoje as cinzas, as cinzas dos mais aptos. Dos homens de excepção, hábeis, inventivos e sempre prontos a juntar um belo sentido da vida e uma bela alma. Vão lá agora pedir-lhes, a eles, que voltem a lançar a semente à terra e o barco ao mar. Então ontem deram-lhes uma esponja para apagar o horizonte e hoje querem que estas vítimas do sacrifício e do espírito de sacrifício, se voltem a sacrificar em nome da loucura das leis que tanto prazer vos dá redigir? Será que estes tais príncipes reinantes de que atrás falei ainda não perceberam que o homem comum, o lavrador, o pescador, têm de saber quais são aqueles em que a sua imaginação pode acreditar como alavanca dos seus actos?
Mário Rui



Lá, como cá!

A Lusa Democrática-recreativa

A politiqueirada portuguesa é uma gentalha execranda, parlapatona, intriguista, charlatã, exibicionista, fanfarrona, de um empertigamento patarreco — e tocante de candura. Deus. É pois isto a democracia?