sábado, 4 de junho de 2016

O melhor


Não tanto por ser um adepto convicto da modalidade, que não sou, mas talvez antes porque ele foi o melhor no seu ofício, obrigo-me a confessar admiração pela figura ímpar que foi Cassius Clay, nome que marcou a minha juventude e que ainda hoje permanece em mim em lugar de Ali, a par de outras figuras míticas que me deram testemunho vivo das transformações que agitaram este mundo. Era o meu tempo jovem, altura em que esse sentimento do forte que tudo vence ainda me fazia crer que os homens podiam construir glória à sombra de empreitadas inúteis, neste caso, esmurrar o nariz ao outro. Mas enfim, verdes anos são quase sempre altura em que sentimos as emoções com intensidade maior e indiferença também saliente. De todo o modo, gostava de o ver a bater as palmas das mãos nas coxas, martelar o chão em cadência, encostar-se com os cotovelos às cordas, tudo isso olhando nos olhos do adversário com ares de guerreiro furioso. Não terá sido porventura o bater das suas mãos o melhor exemplo de vida para mim, quase sempre tão ineficaz quanto uma vaporização, e por essa razão serão muitos os viciados em determinismo comportamental que agora não me entendem. Mas não faz mal. É que tudo o que me veio do exterior para o interior, especialmente aquilo que me fez crescer, foi sempre lição armada para enfrentar a minha existência. Obrigado, Cassius Clay, repousa em paz. Mesmo que tenhas sido um vaidoso, também é difícil ser-se modesto quando se é o melhor, gostei de ti e, por outro lado, deste-me mais uma vez consciência da fragilidade da vida, até quando se é um lutador!
 

Mário Rui
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