domingo, 25 de setembro de 2011

Da "silly season".




Dei comigo a magicar o quão curioso é este meu país. País de extremos, do tudo ou nada, onde os portugueses parecem alheados de tudo o que os rodeia, nomeadamente das preocupações latentes que estão aí à porta mas, de repente, como que saídos de um sobressalto de sono intranquilo, apontam então baterias para o mundo que os cerca. E ainda bem que assim é pois tal estado de espírito sempre os mantém mais alerta, mais avisados, mais preparados para o que vai acontecendo na espuma dos dias que se repetem inexoravelmente.

Pois bem. Digo isto relativamente ao português comum, mas é bom que nos recordemos que também há portugueses incomuns, daqueles que normalmente põem as notícias em ordem, em dia, vendo a CNN. Esses são sem margem para dúvidas os mais ávidos quanto ao que se passa no país e no mundo, quantas vezes não para perceberem se a mole humana que habita o nosso planeta vai resisitindo às agruras do nosso tempo, mas antes para perceberem se a sua própria segurança, que lhes é mais importante que a verdade, continua intacta e sem sinais de ataques vindos do exterior.

De repente, no que a nós diz respeito, e já agora acrescento mais uns tantos que por aí fora também têm um mau acordar, tudo parece querer desabar sobre as suas cabeças. Eis que subitamente se transforma este deserto sombrio da nossa cultura cansada em furacão que resolve todas essas coisas abortadas, desmembradas, apodrecidas, e levanta-as num turbilhão de poeira morta, que o vento arrasta para longe. E, então, nasce outro dia de calmaria e lá se regressa à normalidade.

Mas há alturas na vida , períodos do ano, em que verdadeiramente nada acontece. Pois muito bem, meus amigos, mas em Portugal, este ano, não houve a chamada silly season. É facto que registo com algum agrado, não pelos acontecimentos em si que a marcaram, mas mais porque existiu e sobretudo porque pôs o país a pensar, a falar, discutir, enfim a olhar para dentro de si mesmo. Se com algum resultado digno de registo ou não, já é assunto em que deposito dúvidas. No entanto houve de facto matéria mais que suficiente, quer no país quer no estrangeiro, para dissecar. Ora então vamos aos factos que marcadamente nos assolaram o Verão e foram pasto de sobeja para que jornais, televisões e outros que tais, como os bons jornalistas mais os jornalistas-fatela, se alimentassem e assim dessem asas às suas imaginativas imaginações.

Aí vêm então os ditos que quebraram pela primeira vez, de há muitos anos a esta parte, a tradicional estação fraca ou, dito de outro modo, o período sem novidades excitantes.
Ora vejam:

Antes de mais, o falecimento do estado-de-graça em que parecia estar o actual governo Quanto a esse estado, entenda-se modo de governação, só nos mostrou impostos, mais impostos e ainda mais impostos. É mau assim. Bem sabemos que a troika assim o determinou, mas das coisas que talvez mais custem a compreender a um homem nobre é terem de ir-lhe ao bolso com tal cadência. E o que se espera é que este atavismo não pegue moda para os vindouros.

Depois, também muito se falou do estado social. Aqui a coisa já muda um pouco de figura porque, coitado, acho que já lhe foi passado o atestado de óbito.

No que toca à nossa relação de amor com a Alemanha, também esta foi fortemente abalada. Tão abalada que, em resultado do nosso défice, que o mesmo é dizer da nossa dívida monumental e da frieza de frau Angela Merkl, até apetece citar Boaventura Sousa Santos, quando afirmou que não temos realmente as contas em ordem mas pelo menos não despachámos seis milhões de judeus. Assim é que é falar. Sem papas na língua.

Outro assunto que encheu páginas e páginas de tudo quanto é jornal revista ou áudio-visual (palavra linda), foram os acontecimentos bárbaros em terras de sua majestade, o Reino (des)Unido. Ficámos a perceber que lá, como no Egipto, independentemente de todos os pontos de vista e da sua utilidade, fez-se sentir uma certa tendência em relação a alguns tipos, muitos, que parece que se tornaram fortes e firmes sob a longa luta com condições essencialmente constantes e desfavoráveis. No tal Reino (des)Unido julgo que sem grande justificação para os actos perpetrados pelos jovens que, não lutando por causa alguma, assim ficaram expostos ao ridículo. A verdade é que, também no velho continente, as coisas já não são como eram. Ainda assim, as forças de segurança, inteligentemente lacónicas e reservadas lá seguraram os motins. Mas que a embrulhada foi séria, lá isso foi. Então não é que aqueles guerreiros sem causa conseguiram fazer mais e pior que os Messerschmitt AG alemães da segunda guerra mundial? Há qualquer coisa que correu mal e cá para mim foi justamente tanta inteligência laconicamente reservada das forças policiais britânicas.

No Egipto e aos olhos dos mais atentos, parece-me que as artes e artimanhas próprias da auto-conservação de um indivíduo, Hosni Mubarak, não o levaram nem à auto-elevação nem à auto-salvação. Benditas pirâmides e faraós que embora mumificados não foram molestados. Não sei se porventura não terão doado uma costela de poder, luxúria e vaidade ao tal Mubarak. Quem sabe? É que existem alguns desejos supremos que, ainda hoje, estão terrivelmente interligados.

Da Noruega chegaram-nos as imagens de um tresloucado com aprumo militar que, não lhe chegando o espaço de uma praça que quase destruiu, resolveu passear-se por verdes campos, julgando-se um profundo norueguês, tornando-se agressivo na esperança de se tornar livre. Sabotador da tranquilidade e da ordem mais não merece que o desprezo da espécie humana. Mas cuidado. Numa crónica qualquer que antes deixei escrita, já disse que os movimentos democráticos se estão a transformar numa espécie de organização política em decadência. E essa decadência está a conduzir à diminuição do homem. Devemos pensar na nossa própria estranheza perante o coro e perante o herói trágico desta tragédia.

Falemos agora do Strauss? Não, não é do génio musical. É do outro. Queria ser presidente da França. Ao que julgo tinha-o sido também do F.M.I. Um dia, ou em vários dias, achou-se certamente com um dominio «ideal» para encantar certas senhoras e lá vai disto. E diziam alguns que o homem era do mais puro e racional que algum dia tinham visto. Viu-se. Nem sempre devemos acreditar nas pessoas sensatas. Havemos de desconfiar sempre de algumas tolices a que se prestam. Sobretudo se essas pessoas sensatas tiverem poder!

Acho que já consegui juntar umas tantas notícias, se é que o foram, que em muito ajudaram a quebrar o tédio de um Verão morno e assim serviram para dar ocupação a quem pouco tinha para fazer. Não obstante, ainda vos deveria falar na indignação pacífica dos acampados em Espanha, da subida da taxa do IVA em Portugal, de toda a arte dos gregos que alguns querem menosprezar esquecendo-se que, os gregos, são para a nossa cultura e para todas as outras como o condutor de um carro: seguram muito bem as rédeas. Não se esqueçam disto que vos digo!

Finalmente gostaria de aludir aos espiões, género 007, como o Ian Fleming iria regozijar-se de tanto argumento para um próximo filme, que se vão passeando por cá em recambolescas histórias que, por não conseguir perceber nada do que se passa, nem delas me quero ocupar.

Será que me esqueci de alguma outra história que tenha traído vilmente a silly season de 2011?. Ah, claro! Como seria possível acabar isto sem vos falar do murro que o árbitro Pedro Proença apanhou, ou levou, no Centro Colombo, em Lisboa. É o velho problema teológico – será ?- da “fé” e do “saber” da “razão” ou da “questão” de se perder ou de se ganhar fora do campo. Paciência Proença. Dá agora a outa face.

E por aqui me fico. Só escrevi o que escrevi porque tenho grandes dificuldades em suportar as ociosidades. Dizia alguém que foi um golpe de mestre do instinto humano tornar os domingos de tal modo aborrecidos que mais vale aspirar inconscientemente ao trabalho da semana. Que grande mentiroso!...



Mário Rui