terça-feira, 9 de agosto de 2011

A saga da democracia


E a saga continua. Os acampados em Espanha, as batalhas na Grécia, as manifestações em Israel, os incêndios em Londres, as pilhagens em Birmingham, Liverpool, Nottingham e Bristol. Polícias e ladrões. Os bons contra os maus. A lei contra a anarquia.



Não me perguntem qual a razão para tanto protesto e especialmente para tanta violência. Há anos que ouço falar em segregação, xenofobia, marginalização, exclusão social, como cerne de todos estes movimentos, às vezes espontâneos, muitas outras vezes organizados até ao mais ínfimo pormenor.



De todo o modo, e seja qual for o rastilho que lhes dá chama, é preciso estar atento. O Mundo está em convulsão e talvez seja melhor que todos comecemos a tentar encontrar no outro mais um da nossa comunidade, ainda que na realidade assim não seja. Que pelo menos não os afastemos do mundo que afinal é pertença de todos.



Se em África as barrigas vazias não conseguem sequer gritar por ajuda, fruto da ganância dos que muito querem ter, no velho continente europeu as coisas passam-se de outra maneira. É sabido que muitas vezes o protesto não é em nome da fome mas talvez antes em nome de apetite a mais. Um apetite que se quer assemelhar ao dos que muito têm. Parece-me que aspirar a tanto também será pedir demasiado.



Agora pedir um pouco que seja aos que detêm quase tudo, isso sim, parece-me razoável. Mas atenção porque esta razoabilidade não pode nem deve assentar em princípios de pura selvajaria. É bem certo que a cara deste nosso novo mundo tem sido moldada com as mãos dos que têm poderio e quase sempre sem olhar aos mais necessitados.



E, estes últimos, quer queiramos quer não, já há muito que se interrogam; mas que espécie de homem sou eu se vivendo apenas para o meu trabalho, para a minha mulher e para os meus filhos, os vejo constantemente ameaçados? Não será meu dever defender o que amo e me pertence? É também um direito que lhes assiste. Se calhar aos que trabalham e também aos que procuram ocupação.



A sua carga é penosa, incerta a sua esperança. É necessária uma verdadeira habilidade para lhes inventar soluções ou, melhor, consolações. Nós, os que vamos sobrevivendo, também nos vangloriamos por até aqui termos vivido numa época que gosta de se elogiar por ser a mais humana, a mais suave, a mais justa que alguma vez existiu debaixo do Sol.



Se assim tem sido, e duvidando eu de tal afirmação, então seguramente que os mais bafejados pela sorte e sobretudo os que tudo roubaram em nome da construção de uma civilização mais solidária e unida, enganaram-nos, falharam. E esse falhanço tem vindo a repercutir-se das mais variadas formas como disso é exemplo a saga a que me referi no início.



Que volta dar a isto? Os conflitos que por ora se vivem em vários países europeus, e aqui viro em particular a minha atenção para Inglaterra, não serão certamente insolúveis. Se forem, então o nosso mundo suicidar-se-á tragicamente.



Não sendo um estudioso destas matérias ditas sociais, mas reconhecendo haver injustiça, como de resto qualquer simples espectador reconhecerá, no que toca à justa distribuição da riqueza, às oportunidades que se abrem a algumas pessoas e se fecham hermeticamente a outras, ainda assim, acho que a insurreição a que assistimos por estes dias em cidades inglesas, mais não é que puro vandalismo a soldo de uma ignóbil recriação de adolescentes que mais não reinvindicam senão o gosto da violência pela violência.



Ainda não vi, nem ouvi, os verdadeiros desafortunados da vida à frente do pelotão a apontar as verdadeiras causas para tal actuação. É a crise do desemprego? É a marginalização a que muitos são votados neste País? Será que também acham que a democracia é apenas e só uma forma de decadência da organização política? Eles que durante anos e anos de verdadeira guerra ouviram os discursos inflamados e de fé de Churchill.



Não. Não posso aceitar que estes últimos acontecimentos tenham razões fortes que os sustentem.
Começa-se a adivinhar o que vale alguém quando o seu talento começa a enfraquecer, quando deixa de mostrar do que é capaz. E alguns cidadãos e mesmo dirigentes políticos ingleses já deram provas dessa fraqueza.



Quanto aos tais adolescentes que mais não reivindicam senão o gosto da violência pela violência, tal como disse antes, é preciso guardar alguma da nossa preocupação porque, apesar de tudo, eu também sei, e foi o mesmo Sir Winston Leonard Spencer-Churchill que o disse: «neste mundo circulam muitas mentiras, mas o pior de tudo é que metade delas são de facto verdades»
Mário Rui
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