domingo, 22 de julho de 2012

O nosso tempo


























Ontem mesmo, em nocturna conversa com um amigo, dizia-me ele que o tempo é o que dele cada um de nós quiser fazer. Do tempo que passa por nós e nos arrasta para uma vertiginosa velocidade no modo como fazemos o dia-a-dia e todas as coisas que o compõem.

Depois, pensei mais seriamente no tema da conversa e concluí da razão que lhe assistia quando assim pensava esse meu amigo. Numa altura em que toda a gente caminha para a velhice, e mais não pretende senão a quietude do tempo que passa, parece acontecer justamente o contrário.

Como que um fardo que se nos é posto sobre os ombros, o tempo carrega-nos cada vez mais de pressas, de correrias, de necessidades de fazer tudo a tempo e horas. Quando deveríamos ser nós a passar por ele, não, é ele que nos marca o compasso e duramente nos sujeitamos aos seus ditames. Quase parece uma ordem, uma regra, uma doutrina.

A nossa capacidade de inverter este célere tempo, dita, é quase possível, feita é quase uma impossibilidade. Mas havemos de lá chegar. Com racionalidade e bom entendimento de que o importante não é correr a par do tempo mas antes controlá-lo, parar-lhe a marcha desenfreada com que nos leva, demasiadas vezes, ao nada.

Ficarmos com a certeza que o conseguimos dominar em lugar de sermos dominados. Para quê metermos na cabeça que o mundo acaba se a tempo e horas não completarmos uma qualquer tarefa. Que se dane o tempo. A tarefa há-de concluir-se à medida do nosso tempo. Paremos.

E tem mais! Que tempo é este que não protegendo os mais velhos, ainda por cima lhes anuncia mais velocidade, maior ritmo no andamento? Será mesmo para acabar com o que lhes resta? Um pouco mais de tempo que se deseja, se aguarda impacientemente, mais vagoroso.

É um tempo difícil de explicar este em que vivemos. Mas então se quer ser doutrina, regra, e se formos nós os seus discípulos, convém que sejamos também os seus educadores. Nem sempre é a doutrina quem ensina. São os doutrinados que lhe dão objectivos e condições para tal. Logo, já será tempo para o fazermos e expormos os nossos segredos mais zelosamente guardados.

Poderemos levar a cabo reparação, construção, alteração, mas sempre tendo em vista que, afinal, quem manda no tempo é quem o faz. Nós. Bem sei que o tempo é soberbo! Já o aprendi há muito tempo. Também apreendi, condição mais convincente, que os soberbos são muitas vezes ordinariamente ingratos; consideram os benefícios que nos dão como tributos que se lhes devem.

Mas ainda que o nosso amor-próprio possa ser exagerado nas sua pretensões e quase sempre se ache frustrado  nas suas reais esperanças, deixem que nos deliciemos em tão aprazível esperança.

Se este tempo é um lugar desmesurado para o nosso corpo, e é de facto, então vamos fazer dele coisa mais lenta. Em nosso próprio proveito. Não o contrariando, é soberbo, mas pelo menos não deixando que ele role sobre nós, nos deixe rugas na face que são o estigma da sua acção.

Perguntei ao tempo qual seria a solução. Ele só me disse: deixe-me passar.
     
“O tempo perguntou ao tempo quanto tempo o tempo tem. O tempo respondeu ao tempo que não tem tempo para dizer ao tempo que o tempo tem tanto tempo quanto o tempo tem.”

Mário Rui