sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Indústrias criativas

Não é que me apeteça rir, até porque o assunto é suficientemente sério para o fazer. Há uns anos atrás, no meu papel de radialista e no seguimento de dezenas de entrevistas que entretanto já havia feito em outras tantas eleições, autárquicas, legislativas, parlamento europeu, eu sei lá que mais, sentou-se no estúdio para mais um saudável e renhido frente-a-frente eleitoral, um candidato, por sinal excelente pessoa, que ali ia esgrimir os seus argumentos com os restantes pares de debate.


Para o desenvolvimento da terra, e estávamos em campanha autárquica, este candidato batia-se fortemente pela criação das chamadas indústrias criativas como tratando-se de motor impulsionador de uma nova e profícua actividade, toda ela virada para, afinal, a melhoria das condições de vida de todos os munícipes.

O primeiro aspecto que gostaria de relevar é, ainda, a minha santa ignorância, assim dita porque ainda hoje persiste, sobre o que é isso de ‘indústrias criativas’. Com a total disponibilidade da minha parte para melhor compreender o assunto, muito pesquisei sobre o mesmo e, confesso, pouco aprendi ou, dito de outro modo, concluí tratar-se de pura dialética, de resto muito em consonância com o que se ouve em campanhas eleitorais.

Trago à escrita esta dissertação inicial, não para ridicularizar a pessoa que na altura a defendia, mas antes para me penitenciar por não ter chegado a raciocínio tão eloquente que de facto me permitisse perceber de que coisa falava aquele candidato. Se calhar, e sem qualquer tipo de vergonha, já o disse em relação a outros, a culpa para tal disfunção só a mim poderá ser imputada até porque, se “ burro velho não aprende línguas, não é por ser velho. É mesmo por ser burro”.


Será talvez o meu caso, embora eu de indústria ainda perceba alguma coisa, a minha escola vem de lá e a minha ocupação profissional também. Agora de ‘indústrias criativas’ é que já me embaraço ao tentar decifrá-las.


Bom, mas adiante e vamos ao que agora interessa. E o que agora interessa é, parece-me, volvidos alguns anos após a tal entrevista/debate de que vos falei, repito, parece-me que começo a ver alguma luz ao fundo do túnel.

Aliás já num Governo anterior, nem sei bem em que ano, um outro ministro e julgo até que com a mesma pasta, a da Economia, falava também muito acerca do turismo português e do seu potencial quanto ao real crescimento económico do País. Ou seja, a ideia, à época, e segundo a minha pobre opinião, seria a de pôr todos os portugueses de bandeja numa mão e guardanapo na outra, para servir condignamente esta indústria turística, mais na vertente hoteleira.


Sim, porque estas indústrias têm tantas outras vertentes que o melhor é nem aflorarmos tal coisa. Estaria esse ministro a falar igualmente de indústrias criativas? Às tantas até estava e eu, parvo como sou, a não perceber patavina do que ele dizia. Sou mesmo tótó.


Agora um outro ministro – a mesma pasta - revelou esse mesmo desejo no livro "Portugal na Hora da Verdade", editado antes de assumir o novo cargo, ...com a ideia de trazer pensionistas ricos do norte da Europa para virem viver para o nosso país. E para quê? Presume-se que para dar novo ímpeto à nossa depauperada economia. Se com isso atingíssemos o nosso zen, o nosso ressurgimento, eu até rezaria a todos os santos para que essa vaga se aproximasse com avidez! Como se se tratasse de alcançar alguma coisa.


Finalmente percebi o que são ‘indústrias criativas’. Do mal o menos. Velho e ainda assim a tentar assimilar um pouco do conhecimento deste Mundo Novo. Não me julguem profeta da desgraça, peço-vos, mas a despeito desta ideia e deste ministro, este homem tem, na vida, a arte de improvisar; espanta mesmo o mais subtil dos observadores.


Mas antes de almejada ou apenas estudada esta nova forma de crescimento, por favor Sr. Ministro, importa que se conheça o seu verdadeiro objectivo, o seu horizonte, as suas forças, os seus impulsos, os seus erros e sobretudo o ideal que norteia tal ideia. Olhe que indústrias já temos muitas e algumas delas criativas quanto baste.

Olhe que governantes a pensar de modo tão teatral já os tivemos em quantidade suficiente para dizermos chega! Pois não sabe V. Exa do que necessita o País? Necessita de homens que ordenem grandes coisas: educação, instrução, conhecimento, saúde, trabalho, igualdade de oportunidades, e verá que conseguiremos ser País.


Qual País de turistas? Qual País dos nossos pais? É para o País dos nossos filhos que nos devemos dirigir. Para esse é que devemos, todos, lançar o nosso impetuoso desejo, mais impetuoso que o próprio mar.


Deixando de parte este tom exortativo, só espero deste Governo homens que experimentem mas com os pés bem assentes na terra, que vejam longe, que ouçam os outros, que saibam esperar e que sonhem constantemente com coisas extraordinárias como as que antes enumerei. Livrai-nos das vitórias mesquinhas.


Mário Rui

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