quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Mas qual debate?


Não vi em directo as respostas dos dois candidatos, Passos e Costa, dadas ontem à noite aos jornalistas dos canais de TV.

Optei por ir jantar com amigos a sítio costumeiro, local de resto onde sempre promovemos debate sobre a terra e o país que nos habita. Debate, disse bem. Felizmente que não há por lá «entrevistadeiros» como os que depois vi na pantalha televisiva, através de gravação, no correr do dito concurso de perguntas e respostas.

Digerido o repasto mais o debate entre amigos e engolidas depois as celebrações e diabolizações vistas e ouvidas, das quais não me apetece fazer juízo, há uma coisita que me ocorre e que é esta ; não assisti a qualquer ‘debate’ pelo que recomendo vivamente às televisões que hoje, ou amanhã, mostrem ao país um desses a sério que teve lugar em 1975, entre Soares e Cunhal. Embora desfasado no tempo e no conteúdo, seria uma monumental forma de mostrar a Portugal, às próprias televisões, aos jornalistas e aos candidatos, como manejar a ferramenta jornalística e o desempenho de quem responde em proveito do espectador. Falo de educação e informação para todos já que esta nova revolução de mentes ditas comunicacionais que ontem presenciei, cada vez mais cava um abismo entre a população que quer perceber, em vez de o preencher. Perguntas ensanduichadas para respostas compactadas fizeram com que assistíssemos não só à contracção do tempo e do espaço como também, lamentavelmente, à sinestesia de todos os nossos sentidos. Não sei se isto é a imposição de um modelo estrangeiro, mas a verdade é que tanta instantaneidade, pressa de palavras, imediatismo no acto de questionar e retorquir e fandango «entrevistadeiro» a três tempos, foi só um conflito de interpretações que a ninguém serviu. A compreensão dos que viram tal concurso de perguntas e respostas, que não debate, ficou menos forte uma vez que hoje, no meio mediático, vale muito mais a ilusão da concisa expressão de quem debate do que a real faculdade de se dar a conhecer o que se debate. Culpa da televisão, mas também culpa de quem concorda em sentar-se em palco informativo onde o virtual supera a realidade. Em jeito de hibridação de valores, também gostei muito daquele tratamento pessoal - quase tu cá, tu lá - utilizado pelos «entrevistadeiros» quando se dirigiam aos dois políticos; “- Costa, diga-nos lá….”, “- Passos Coelho, explique-nos como é que …”. Fandango puro!

Terá razão Guy Debord quando na Sociedade de Espectáculo refere “o nosso tempo, sem dúvida… prefere a imagem à coisa, a cópia ao original, a representação à realidade, a aparência ao ser…”?


Mário Rui
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Sabemos usar a palavra “sofrer”, mas saberemos descrever “sofrimento”?


Só eu sei da dificuldade que me assola a propósito de emitir opinião pensada, e se possível sensata, quanto ao acolhimento a dar aos que procuram afectos e melhor pátria onde possam viver em paz. Se é certo que de entre os que fogem de países em chamas muitos não buscarão mais do que paz, outros terão encontrado porta aberta por onde livremente possam passar ódios e revoltas interiores e desse modo as venham a pôr em prática, desassossegando os que estão deste lado europeu, sítio onde civilização ainda é, para nosso contentamento, designação dada a uma ortodoxia que mantém traços do seu propósito original, ou seja sítio onde humanidade não é sinónimo de coisa decaída. É muito bom, pese embora um outro rol de sacrifícios que também nós trilhamos, podermos gozar de uma Europa que todos os dias mostra um Sol que brilha de novo e uma Lua que sai todas as noites. Não sei se os que nos batem à porta alguma vez tiveram oportunidade de viver assim, não sei sequer se em qualquer dia tiveram ocasião de ficar alegres com o seu próprio Deus. Sei de coisa diversa e que se resume a uma solidariedade que, não podendo no meu caso oferecer cama, mesa e roupa lavada, ainda pugna, no mínimo, pela defesa e respeito de uma esperança que não desiste, mesmo em face do desespero, uma fidelidade que acredita no quase inacreditável tal é o tamanho de quem por ela luta. Abomino, a exemplo de tanta gente, os que não nutrindo gratidão alguma para com o semelhante assim se vão arrastando para cá apenas com o sentido de nos porem a ferro e fogo. Terroristas fanáticos que são o supérfluo, o excedente da sociedade, loucos aos quais oferecemos todas as nossas razões pelas quais somos cristãos e mesmo assim essa turba encontra nesta oferta todas as razões para nos dizerem que não o devemos ser. Pois que permaneçam por lá, pela terra que os viu parir e se possível em constante reflexão, não néscia, o que eu acho improvável mas talvez um dia aconteça, na companhia do seu profeta. Aos demais de que antes falei, pacíficos em fuga, acho que lhes é devida pela Europa da cultura e dos vínculos fraternos, uma oportunidade de enquadramento sólido e fiável e talvez assim fiquemos todos a ganhar. É a perspectiva desta vantagem que faz com que as partes se interessem pela discussão, disputa, compromisso e acordo de modo a que o resultado final garanta um estar social mais feliz para a humanidade. O que é doloroso é não alcançar um destino digno e simpático para todos os que o procuram e é bom que não esqueçamos os que querem mudar de lugar posto que se o fazem é porque já o perderam noutro sítio. Até connosco isso acontece e quem procura melhor bate-se pela felicidade possível. Ou não?


Mário Rui
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