quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

O último dos aventureiros aristocratas



Que querem que vos faça? Tenho uma admiração especial por este homem. Porquê? Porque era gordo, fumava charuto, foi o ícone da liberdade ocidental, tinha mau feitio, permanentemente instável, gostava das jogadas arriscadas, foi prisioneiro e conseguiu evadir-se, publicou livros, esperou sempre deixar o seu nome ligado a qualquer coisa de grandioso, tinha eloquência nos debates parlamentares, na década anterior à segunda grande guerra esteve quase sempre contra as opiniões dominantes entre a classe política inglesa, sempre soube que não se podia negociar com Hitler, foi o único que proferiu a célebre frase "sangue, suor e lágrimas" na defesa do seu país, se aliou a alguns inimigos na perspectiva de lhes levar a melhor, por vezes errático e irresponsável, fez sentir a todos que as causas pelas quais lutava, valiam a pena e, finalmente, foi o último dos aventureiros aristocratas.

Se conheceram ou se conhecem outro assim, avisem-me por favor

Mário Rui

O de ontem igual ao de hoje.



Corria o ano de 1937, já quase no seu fim, quando foi promulgado o decreto para valer como lei que recebeu o n.º 28219. O dito estabelecia então uma licença anual obrigatória , pesadamente paga pelos portugueses que usassem “isqueiro” ou outros “acendedores”. Naquela altura, o Estado mostrava-se implacável com quem pretendia aproveitar-se dos avanços da tecnologia , e então fazia pagar por essa liberdade todos aqueles que se propunham empobrecer a protegida indústria fosforeira. Mais tarde passou por cá mais um avanço da tecnologia. O “rádio-transistor”. E, então, português que se prezasse lá encostava o “transistor” ao ouvido para, alegremente umas vezes, tristemente outras, escutar o que o regime de antanho queria dizer ou fazer.
Bom, quer no caso do “isqueiro”, outros “acendedores” ou “rádio-transistor, sendo que para este último também se pagava uma taxa, qualquer simples utilizador dos mesmos, sempre andava escondido quer fosse para acender o cigarro ou ouvir rádio. De outro modo, corria o risco de ser fortemente penalizado por umas personagens aberrantes, fiscais das finanças ou mesmo da polícia, cujo único modo de vida era justamente andar à caça destes “malfeitores”. Já estávamos no século XX mas a verdade é que aqueles bacocos governantes não percebiam, ou não queriam perceber, que o mundo pulava e avançava em nosso redor, sendo que por cá havia um especial que se dedicava a pensar por todos os portugueses. A páginas tantas, até teria alguma razão no seu intímo para o fazer. Pensaria ele que dessa maneira poupava o ‘consumo’ de inteligência à população. Burro, tá bom de perceber. Aliás chamavam-lhe fascista. Eram ainda assim muito poucos os que se apoderavam dessa designação para qualificar o homem. Mas enfim. Relativize-mos as coisas. Depois de Abril de 74, já eram muitos ou quase todos os que, sem qualquer pudor, assim o qualificavam. Também facilmente se percebeu na altura, e muito melhor nos anos que se seguiram, o quão vantajoso era, e é ainda hoje, para alguns, fazer uso dessa terminologia. Sim porque hoje já não há fascistas, nem nada que se lhe pareça. Pura mentira. Hoje o que há é gente que pensa como a gente de então, só que de forma mais subtil. Que bonito soa a alguns quando dizem que se “acabou o mau tempo de outrora” e que a partir dessa revolução dos cravos, estamos em “boa sociedade”, de um entusiasmo terno, generoso, e que felizes somos por sentirmos o rococó dos efeitos da democracia plena. Vão-se encher de moscas que a mim nunca me enganaram. Foi preciso responsabilizar e julgar impiedosamente os sentimentos dessa gente, gente dos tais quarenta e oito anos de noite deveras escura, como seria imprescindível julgar hoje mesmo outra gente de carácter errado e que há tantos anos nos conta apenas e tão-só a falsidade deste mundo português que habitamos. Mas não há remédio que “cure” esta gente de agora. Até ver...
Não estou a ser justo? Então vejam: não a memória dos tempos em que o legislador reprimia quem possuia "isqueiros", outros "acendedores" e “transistores”. Mas as memórias que hoje permitem registar e guardar essas outras memórias. A memória dos computadores, os discos rígídos, os discos multimédia, os "discos" SSD, os vulgares leitores MP3/4, os telemóveis com capacidade de armazenamento.
Por iniciativa do PS, que pelos vistos os outros partidos acompanham, está em discussão uma lei que, se aprovada, implicará o agravamento de mais de 20 € do preço do disco de 1TB onde qualquer bom pai pretende guardar as fotos de família. Ou de mais de 50 € na aquisição de um disco multimédia onde queremos armazenar os filmes que fizemos ao longo da vida, ou outros que comprámos.
Dizem que é para proteger os autores e os seus direitos e não para gerar uma receita mais para o Estado. Mas quais autores e que direitos? Os autores que, por via das novas tecnologias, viram multiplicado por mil o poder de difusão das suas obras? Aqueles que se tornam conhecidos em dias quando no tempo do vinil demoravam anos a mostrar o seu talento? Que direitos de autor (e de que concreto autor) violo eu quando adquiro uma PEN para guardar os meus documentos, as minhas fotos, as minhas crónicas para a rádio ou para outro qualquer meio de informação que muito bem me apeteça?
Está visto, continuamos no mesmo País bacoco e pacóvio onde a capacidade das máquinas não se sobrepõe nem se substitui à falta de inteligência de quem nos dirige. Este legislador, em pleno século XXI, nem percebe que de qualquer parte do mundo se encomendam hoje esses dispositivos, transportados num vulgar envelope postal. Ou será que, para além do absurdo de taxar a aquisição de novas tecnologias, pensa o parlamento determinar com força de lei que os inspectores do fisco ou os polícias voltem a abordar quem suspeitem ter cometido o crime de não pagar tributo pela memória?
Os estrangeiros ficam espantados e sentem-se atraídos pelos enigmas e invenções dos nossos governantes. Não seria bom para Portugal que tais governantes emigrassem e com eles levassem longe tanta sabedoria? Emigrem pois e desapareçam da nossa vista. Não queremos correr mais esta etapa convosco!

Mário Rui

Lei da cópia privada. Discos rígidos, telemóveis e MP3 podem ser taxados | iOnline

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