segunda-feira, 2 de setembro de 2019

Praia da Torreira-Murtosa

 
Ao cair da tarde também se pensa porque há luzes que só podem nascer de uma grande soma de factos.
 
Há só um mar no meu país. E esse, não importa de que lado se veja, oferece-me sempre um surto de poesia, panoramas íntimos do coração, até onde se perdem os olhares da minha ânsia de querer ver. Tudo lhe é passado, actualidade, futuro, tudo presença. Sentimento, muito, por aquilo que me deixa cogitar quando lá longe também perscruto a areia branca da praia. A maior de quantas distâncias logre a minha memória recriar, assim fico no ontem até onde se somem todos os ‘hojes’ que me possam dizer que, afinal, não há abismos entre épocas. E assim, do sítio onde estou até aquele onde outrora estive, já se estabeleceu a corrente. Rápido como a luz corre o pensamento das coisas de antanho, das amizades que comigo pisaram o areal, das mútuas atracções, dos apertos em que se confundiram as mãos que se procuravam, ou tão-só dos abraços conseguidos entre simpatias recíprocas. E quão curtos se faziam os dias. Mas, reconhecendo a escassez das minhas faculdades para acomodar o ambiente de então às minhas ideias de reconciliação presente, só posso estar grato a este mar, a este vento, a esta praia. Abrem-me os olhos à realidade evidente da minha incapacidade de mudar o tempo mas sem que abismos me separem de épocas. Por ora, recolho a vela, navegante desenganado, antes que onda ciumenta me arranque da alma a recordação sagrada.
 
Mário Rui
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