quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

A “actualização” a que a todo o tempo se procede contra quem a não segue


Estou muito contente. Neste início de ano já me mandaram cartas vários amigos, da onça, que nunca me esquecem nesta altura. E, imaginem, só passaram ainda três alvoradas de Janeiro. São uns queridos, todos, pois quando me preparo para mais 365 dias na passadeira da existência, eis que toda esta gente me vem lembrar que afinal a vida é diabolicamente linda, como um sorriso da Julia Roberts, ‘um sonho de mulher’, e prodigiosamente alegre, como uma carteira a transbordar de notas. E, vai daí, começou então a temporada oficial da minha caridade para com todos esses companheiros. Por entre farta actualização de preços e com data marcada, enternecem-me muito os rogos feitos com tanto desprendimento, tanta simplicidade, tantas virtudes. Súplicas destas já me chegavam as do Centeno e as do Costa, se bem que, devo dizer, também eles com muita caridade, ao ‘dobrarem’ todas as nossas dificuldades, embrulhadas em todas as tretas. Por falar em tretas, acrescento que, neste último caso, quer um, quer outro, gastam fartas somas para os pobres mas os únicos que as não recebem são precisamente estes. É estranho, pois comigo passa-se exatamente o contrário, ou seja, gasto fartas somas com os ricos e são precisamente estes que as recebem. Vá-se lá perceber esta conta-corrente, embora dela ainda consiga tirar uma conclusão: é que quer faça chuva, vento ou frio, sinto-me sempre animado de um desejo intenso de praticar o bem. Já quando o tempo adrega de aquecer um pouquinho, um sol esquivo, mas amigo, rompe-se-me na alma uma erupção de piedade que não há xarope que a trave. Postas assim as espécies, vou tentar exemplificar algumas das misericórdias de per si a que acudo, segundo o critério curioso dos grandes satirizadores da comédia anual de preços em Portugal. Luz, água, gás, gasolina, seguro, IMI, IRS, taxa de ocupação, taxa de exploração, taxa de manutenção, taxa de televisão, taxa de protecção, taxa da taxa, e assim vamos de tributo em tributo até à taxa das récitas da nossa caridade. Já faltou mais! Tudo sobe, e não há ninguém que recuse o nosso auxílio a qualquer rapioca beneficente. Mas enfim, uma pessoa p’ra ser feliz não pode pensar muito. É o que é!
 
 
Mário Rui
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