terça-feira, 1 de outubro de 2019

Adormecidos em silêncios sonoros de mosteiro, acordem!

 
O nariz torcido de alguns contra as novas tecnologias que melhoraram exponencialmente a vida das pessoas não é algo novo. A atitude vai desde a simples dúvida até ao alarmismo que se levanta face ao que é avanço. Uma postura que, de resto, faz lembrar outros tempos em que receio semelhante se instalava sempre e quando o mundo dava um pulo para diante. Foi assim em 1809 com a reacção à ideia da iluminação pública a gás e algo semelhante se passou em 1839 com o conceito da anestesia na medicina. Mais recentemente, em 1999, o pânico passou a morar na cabecinha dos cépticos pois defendiam que o comércio electrónico ameaçava destruir mais do que poderia criar. Julgo saber que ainda há quem ache a simples calculadora de bolso superior ao computador e, carregando mais nas cores, os que afirmam a pés juntos ser o cavalo mais duradouro e fiável do que o terror do automóvel. Estes últimos, certamente, defenderão ainda que os automóveis destruíram o negócio dos estábulos e mudaram para sempre a forma como as pessoas namoram ao acabar com a tradição dos passeios românticos de carruagem. Temos pena mas o mundo anda para a frente e por tal convém aos pessimistas fazer de vez em quando uns intervalos lúcidos de pensamento. Dito isto, trago esta conversa a terreiro pela simples razão de não perceber os insistentes do “antigamente é que era bom”. É que não os compreendo nessa pulsão que os deixa imbuídos de certezas absolutas quanto a esse passado que, pelos vistos, era o alfa e o ómega da existência humana. E com tanta gente hostil ao novo, ao moderno, ao que de melhor se foi fazendo à escala planetária, gostaria de saber da razão por que estão os centros comerciais cheios quando afinal ninguém os frequenta. E porque será que se vendem milhões de telemóveis posto que já ninguém telefona a ninguém. Computadores enxameiam os lares. Também não entendo para quê se afinal ninguém tecla o que quer que seja. Fotografias, aos biliões, mas ninguém as tira porque isso é lista de novos pecados. Máquinas para fazer o clique, nem pensar. Ninguém as compra pois as lojas estão a abarrotar delas. Automóveis, caros e bonitos; não há quem os queira mas que eles rolam, rolam, sem os donos, pois claro. Pessoalmente não aprecio tal aliança de muitas pessoas com a coisa de antanho. Dão o litro por ela, mas nada salva essa tentativa poética e patética de a guindar ao elogio pois quando lhes falta a modernidade logo mostram a melhor das compreensões para a comprar a qualquer preço. Não fosse eu novo há muitos anos mas contemporaneamente envelhecido, que remédio, e esta crónica de tempos vividos seria um tal desancar em gente cujas células cerebrais me parecem bastante instáveis. Isto porque escrever sobre alguns relhos é apenas estar atento.
 
Mário Rui
___________________________ _____________________________ 

Sem comentários: