sábado, 12 de março de 2022

Ucrânia: Sobre o ódio, quem o viu face a face?









É só isto que vos quero mostrar, escondendo por agora muito mais a propósito do ódio, irmão sobrevivente, que permaneces sempre sombrio no espírito de um assassino de seu nome Putin. O que seria destas pobres criaturas a quem a Rússia tudo roubou, se não fosse o ódio? O que vai ser desta gente, se castrada de todas as ambições e de todos os sonhos, coçando a ilusão da esperança que, neste preciso momento, é o único quinhão dos inocentes mas que tarda em chegar, se é que chegará. O ódio, misantropo e triste, prefere os sem culpa alguma, se bem que não desdenha dos “ricos” dinossauros do país invasor e outros dinossauros de países não invasores. Estes maestros cujo apoio ao morticínio lhes serve para reger a orquestra da pena capital, falam-me do motivo da guerra, dos interesses estratégicos, da geopolítica, sabem tudo sobre a Rússia e a Ucrânia, mas infelizmente nada sabem de alguns milhares de criaturas que dormem ao relento e vivem ao acaso. Pensem agora, maestros da guerra, nomeadamente os de cá, porque também os há e em razoável número, no que representa para os atacados uma noite de Inverno. Escorraçados dos bancos públicos, escorraçados das ruas, eles e elas não encontram refúgio senão nalgum portal escuro, nalgum telheiro abandonado, nalguma furna da serra conquistada sob a invernia. Deixem-se de se armar em actores ignorantes de uma angustiosíssima tragédia. Lembrem-se antes, profetas da desgraça, destas pobres criaturas, de roupa rota e ensopada, dos seus pés nus chapinhando na água, toda a noite e todo o dia tiritando, curtindo infelicidades e enxugando com o seu já pouco calor a alma. Para elas a vida é coisa bem amarga.  Os míseros não têm cama, não têm que vestir, não têm refeição na mesa, sobram-lhe balas, punhais, mísseis, morte lenta e tudo parece combinado para perseguir o indefeso. Mas é preciso, é urgente, é indispensável buscar calor. Onde? A vós, como sois bons maestros da orquestra da morte, e como a vossa repelente música fúnebre, igual à de Putin, é grande mestra na arte de ajudar os infelizes varejados pelas balas, ireis certamente dizer-lhes que o fogo não tem riscos e o ódio não perturba. Até sereis capazes de lhes lembrar que as árvores, eternas paralíticas, não sofrem angustiadamente. Para vós, nesta guerra, uma criaturinha inocente que valsa e morre é o vosso enlevo. Quantas vezes têm vocês tomado um copo de triunfo entre as mãos, e, todavia, uma houve em que subtilmente ele vos caiu, se vos escapou e foi quebrar-se no chão? Quantas vezes, quando estais de acordo com a guerra, o vosso travesseiro vos afaga a cabeça e vos aconselha a mudar de vida? Se calhar, nunca!


Mário Rui
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