quarta-feira, 3 de novembro de 2021

Vale tudo e até um par de botas


Um par de botas brancas e com o logotipo da Nike usadas pela estrela lendária da NBA Michael Jordan, no quinto jogo da sua primeira época com os Chicago Bulls, em 1984, foi vendido na passada segunda-feira por quase 1,5 milhões de dólares (1,26 milhões de euros), estabelecendo um preço recorde no leilão de calçado usado no jogo.

Longe de poder estar perto de perceber estas coisas, porque sou antigo, acho que dantes a esfera destes “compromissos” era mais modesta. Hoje, todos os sonhos e todas as pretensões têm ante os olhos um espaço indefinido por onde mergulhar a vista, dentro do qual podem girar todas as ambições. Não se queira ver nestas minhas reflexões propriamente censura ou sequer crítica a quem, pelos seus sacrifícios e competências, se alcandorou ao estrelato. O que eu deploro sumamente, embora o meu papel nestes cenários valha pouco, é a facilidade com que se montam estes aparatos sedutores de exterioridades populares, mas extremamente caros. E, mesmo fazendo um grande esforço para os perceber, continuo a não enxergar como é que essas classes ricas vão bebendo avidamente o licor do desmando, em que a proeminência do dinheiro supre a ausência do gosto e do siso. Ou será a mim que este último começa a falhar? Estroinices, rapaziadas, destemperos, dizem, encolhendo os ombros, certos personagens como eu. É pouca essa gente que assim pensa? Talvez, mas também convém que alguém a lembre de modo a não deixarmos que a enxurrada engrosse. Se já começa a ser uma “tradição” no desporto, atente-se ao que se passa também no futebol, então desconfio que veio para ficar. E, se se perpetuar essa “tradição”, o melhor é começarmos a reflectir seriamente sobre a mesma já que quanto mais insensata ela for, tanto mais degenerável se tornará e não haverá força para a conter já que, onde só houver interesses que a explorem, vale tudo e até um par de botas. E tanta gente com falta delas!


Mário Rui
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